Saiba porque a fórmula “220 - idade” não serve para estimar sua FCmax, além de uma melhor alternativa.
Se você for um profissional da
área da saúde, com certeza você já viu a seguinte fórmula:
FCmax=220-idade
Ela, frequentemente, aparece em livros e artigos e
é utilizada e transmitida por diversos profissionais.
E mesmo que você não seja ligado
a área da saúde, é bem possível que você já tenha visto ou ouvido essa fórmula em algum
lugar. Quem sabe em uma revista fitness, num blog, no facebook, twitter ou mesmo
na academia. Talvez até já tenha aplicado ela em si mesmo.
Essa fórmula diz (ou melhor, prediz) o
seguinte: sua frequência cardíaca máxima (FCmax) estimada é igual a 220 menos a
sua idade em anos.
Mas de onde diabos saiu esse número?
Quem inventou esse cálculo e quão preciso ele é?
Geralmente, vemos essa fórmula
atribuída a Martti Karvonen (um médico, professor e autor finlandês), porém, segundo
pesquisadores americanos, na verdade, ela não apenas não foi criada por
Karvonen como, sequer, foi publicada com base em pesquisas científicas.
O Que Eles Fizeram
Aparentemente, trabalhando em algum artigo qualquer,
os autores Robert Robergs e Roberto Landwehr esbarraram em um problema na hora
de citar a origem da fórmula “220-idade”. Eles não conseguiam encontrar a
pesquisa original onde a mesma teria sido publicada.
Então, eles tentaram falar com o
suposto criador da fórmula, Dr. Karvonen, o qual, para surpresa dos
pesquisadores, disse que nunca havia publicado esse dado e recomendou que eles
olhassem os trabalhos do Dr. Astrand para encontrar a pesquisa original.
Ao verificar os estudos de
Astrand e entrevistá-lo acerca do cálculo, ele também declarou que nunca
publicou tal dado.
Ou seja, a fórmula usada mundialmente
para estimar a FCmax não tem pai nem mãe e, nem mesmo, é baseada em ciência.
Segundo os autores, a origem da
fórmula é uma estimativa superficial, baseada em observações de uma série de
dados brutos e médios compilados em um estudo publicado em 1971.
Possivelmente, ela até já estava aqui quando nós,
humanos, chegamos na Terra, nós apenas nos adaptamos a ela. É daquelas coisas
que sabemos instintivamente, tipo que temos que respirar para sobreviver e
que precisamos engolir coisas para nos alimentarmos.
Mas eu não acredito muito nisso. Acho que essa fórmula deve ser bem mais antiga. Talvez ela tenha sido
enviada pelos deuses em alguma época pré-histórica e passado de geração em
geração até os dias atuais. Ou ela pode ser um tipo de doença genética, que foi transmitida e evoluiu furtivamente junto com os humanos, até que começou a se manifestar nos últimos tempos.
Por Que Isso É Importante?
A frequência cardíaca (FC) é uma
medida muito simples de se obter. Mesmo um leigo pode fazê-lo sem o uso de
qualquer equipamento, embora, para seu monitoramento durante o exercício, o uso
de um frequencímetro seja aconselhado (hoje em dia até os smartphones tem um).
A medida da FC é frequentemente
utilizada para avaliar a resposta cardíaca ao exercício e na recuperação ao
mesmo, bem como para a prescrição de intensidade do exercício, normalmente em uma
porcentagem da FCmax (ex.: 70% da FCmax).
Nos últimos 100 anos, a pesquisa
científica demonstrou que há, de fato, uma frequência cardíaca máxima, em que,
apesar de aumentar a intensidade do exercício, a FC permanece estagnada.
Alguns estudos levaram diversos
voluntários de diferentes idades e populações até a exaustão e verificaram sua
FCmax. Depois disso, eles tentaram criar um cálculo que pudesse predizer a
FCmax apenas através dos números, baseado na média dos indivíduos avaliados,
sem a necessidade da realização de um teste máximo.
Além disso, um dos usos da FCmax,
em combinação com a FC de reserva (FCres - que é a FCmax menos a FC em repouso –
essa sim criada por Karvonen), tem sido em equações e protocolos para estimar uma
outra variável importante para o exercício, o VO2max (consumo máximo
de oxigênio).
O Problema Disso
Não apenas a fórmula “220-idade” é
bastante imprecisa, como diversas outras tentativas de estimar a FCmax também apresentaram
uma grande margem de erro de, em média, 7 a 11 batimentos por minuto (bpm).
Os autores coletaram 43
fórmulas de diferentes estudos relacionados às mais diversas populações, 30
delas referentes apenas a sujeitos saudáveis, e mesmo criando (por regressão)
uma equação baseada em todos esses estudos (FCmax = 208.754 - 0.734 x idade),
ainda obtiveram uma margem de erro de aproximadamente 7bpm.
O uso de fórmulas com múltiplas
variáveis (como idade, nível de atividade, tipo de equipamento utilizado, entre
outras), encontradas em outro estudo, também não tiveram muito sucesso em reduzir
essa margem de erro.
E Qual Seria a Margem de Erro Aceitável?
Segundo os autores, para a
estimativa de intensidade do exercício baseada em uma porcentagem da FCmax, um
erro de até 8bpm na FCmax estimada causaria erros irrelevantes em relação à
intensidade estimada.
Por exemplo, se sua FCmax fosse 190bpm
e você fosse se exercitar a 70% da FCmax, considerando um erro no cálculo
preditivo de 8bpm para menos (182), ao invés de exercitar-se a 133bpm (que
seriam os 70% reais), você iria exercitar-se a 127bpm, ou seja, a 67% da FCmax.
Dessa forma, para cálculo de
intensidade do exercício submáximo, uma margem de erro de até 8bpm é aceitável.
Já, se por outro lado, você fosse
usar o cálculo de FCmax para estimar seu VO2max (através do protocolo
da ACM, neste exemplo), um pequeno erro de 6bpm para menos, por exemplo, já
iria subestimar seu VO2max em -8,3%, o equivalente a -4,7 ml/kg/min.
Uma diferença de apenas 4bpm já causaria um erro de 5,6%.
Assim, para estimativa do VO2max,
uma diferença de não mais que 3bpm na FCmax estimada seria tolerável.
O Que Isso Significa Para Mim
Segundo as conclusões dos
próprios autores:
- Até o momento, não existe um método aceitável para estimar a FCmax;
- Se você realmente precisar estimá-la, eles sugerem o uso da fórmula de Inbar:
- FCmax = 205.8 - 0.685 x idade
A margem de erro dela ainda é bastante
grande, equivalente a 6,4bpm.
Ainda assim, ela pode ser útil
para estimar a intensidade do exercício, contudo não convém usá-la para estimativa
do VO2max.
Se você preferir usar uma fórmula
que você consiga lembrar (apesar de ser ainda um pouco mais imprecisa), você
pode usar esta versão simplificada (Tanaka, 2001):
FCmax=206-0,7 x idade
Em todos os casos, a ordem do
cálculo é primeiro a multiplicação, depois a subtração, OK?
Fonte:
1. Robergs R, Landwehr R. “The surprising history
of the "HRmax=220-age" equation”. Journal of Exercise Physiology
Online. 2002 May 2; 5(2), pp. 1-10.
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