Saiba como fazer o Treino Intervalado de Sprint (SIT) e suas aplicações, com exemplos de protocolos utilizados pela ciência.
Foto: LeonMartinez em Pexels |
Este artigo é parte de uma série sobre HIIT, você pode encontrar os demais artigos aqui:
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Já explicamos anteriormente que o
HIIT não é uma grande novidade no universo do treinamento físico. Apesar de o
HIIT moderno ter sua origem no início do século passado, essa modalidade está
bem “na moda” atualmente.
Mas o rótulo HIIT - Treino
Intervalado de Alta Intensidade - possui diversos tipos de protocolos e modelos
diferentes, cada qual com um ou alguns objetivos específicos. Atualmente,
podemos dividi-lo em quatro subtipos básicos:
HIIT de intervalos curtos, HIIT
de intervalos longos, SIT (Sprint Interval Training) e RST (Repeated Sprint
Training).
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Se você chegou até aqui através
dos outros artigos é possível que você tenha se surpreendido com o fato de não
ter que morrer pra fazer HIIT. A maioria das pessoas pensa que HIIT tem que ser
feito sempre com o máximo de intensidade possível, mas vimos nos outros dois
formatos que isso não é verdade, já que eles são submáximos.
Isso tudo acaba hoje.
Conheça agora o terceiro método desta
série, o Treino Intervalado de Sprint (SIT).
O Que É o SIT
O SIT consiste em tiros máximos de
30 segundos (ou 15 a 45 segundos), alternados com intervalos de descanso com
duração de cerca de 4 minutos (ou 8 vezes o tempo do tiro), normalmente passivos
(parado/caminhando).
Qual Exercício Escolher
Qualquer modalidade em que seja
possível desenvolver esforços máximos é uma boa candidata ao Treino Intervalado
de Sprint.
As modalidades vão desde
exercícios cíclicos clássicos, como corrida, ciclismo, remo e natação, até exercícios
mais variados como, por exemplo, elíptico, airbike, subir escadas, sprint em
subidas, suicídios (corrida com troca de direção), pular corda, empurrar trenó,
patinação, esqui, corda naval, movimentos calistênicos, dentre diversas outras possibilidades.
É importante que você possua uma
técnica adequada na modalidade pretendida, pois como os esforços serão máximos,
o risco de lesão aumenta bastante se sua execução for ruim ou desleixada.
O mesmo vale se você não for
acostumado com o exercício em questão. Nesse caso, é aconselhável fazer um
trabalho progressivo, visando adaptar-se às demandas do SIT.
Qual a Intensidade Utilizada?
Máxima! Do início ao fim do tiro!
Corra, nade, pedale ou bata corda
naval como se sua vida dependesse disso.
Não há qualquer necessidade de
testes prévios ou cálculos de intensidade, dê seu máximo durante todo o sprint e pronto.
Claro que sua performance vai
decair durante o tiro e no decorrer dos próximos tiros (podendo chegar a
diminuir 20%), mas o esforço deve ser máximo em todos os sprints.
Como Fazer os Tiros
Idealmente, o volume de exercício
deve permitir atingir cerca de 2 minutos
de trabalho total (apenas tiros, sem contar os descansos), mas isso pode variar
de acordo com o objetivo e a modalidade, podendo alcançar a metade ou o dobro
desse tempo (de 1 a 4 minutos).
Embora o intervalo mais comum seja o de 30 segundos, existem algumas modificações
testadas pelos cientistas ao longo dos últimos anos. De um modo geral, pode-se
considerar SIT treinos com tiros de 15 a 45 segundos (há estudos que chegam a
até 60s de sprint e outros que começam com 10s).
Esse tempo máximo é altamente
dependente da modalidade escolhida. É provável que você consiga fazer tiros
máximos de 45s na natação (especialmente em piscinas pequenas ou
semi-olímpicas) ou no remoergômetro, agora se você for tentar fazer isso em uma
bicicleta ou correndo é provável que você não consiga usar intensidade máxima
durante todo o sprint.
Assim, o número de tiros deve
levar em conta o tempo do tiro e o tempo total de trabalho pretendido. Entre 2 e 10 tiros pode ser uma faixa
interessante para você pensar em trabalhar.
Como exemplo, podemos citar um protocolo
utilizado por Gibala¹, feito em bicicleta ergométrica, de 4-6 tiros de 30s/4min,
totalizando 2 a 3 minutos de trabalho e um tempo total de treino de 18 a 27
minutos (sem contar o aquecimento). Um modelo de 8 x 15s/2min seria equivalente
aos mesmos 2 minutos de trabalho (e 18 minutos de treino).
Tenha em mente que um protocolo
mais longo é muito mais “sofrido”, contudo apresenta um maior potencial para
adaptações fisiológicas positivas (especialmente em relação a emagrecimento), embora possivelmente não faça muita diferença na performance.
Como Deve Ser o Descanso
Em linhas gerais, o intervalo de
descanso entre os tiros é equivalente a, aproximadamente, 8 vezes o tempo do
tiro (1:8).
Alguns estudos até utilizaram tempos menores (1:6 ou 1:4, por exemplo), ou mesmo maiores (1:9), aparentemente sem maiores benefícios do que 1:8, exceto pela menor duração do treino com a redução do descanso.
Alguns estudos até utilizaram tempos menores (1:6 ou 1:4, por exemplo), ou mesmo maiores (1:9), aparentemente sem maiores benefícios do que 1:8, exceto pela menor duração do treino com a redução do descanso.
O propósito aqui é que o descanso
seja longo, porém insuficiente para repor completamente os estoques de creatina
fosfato nos músculos, de forma que os mesmos sejam depletados rapidamente ao
longo dos tiros subsequentes. O resultado é um trabalho mais anaeróbio no
início da sessão e progressivamente mais aeróbio a cada tiro realizado.
O descanso é passivo, mas é
fortemente recomendado que você mantenha um certo tipo de movimento após o fim
do tiro. Reduza a velocidade por diversos metros (se a modalidade permitir) e
siga caminhando durante algum tempo.
Além de evitar o risco de lesões
por paradas bruscas (corrida), você corre menos risco de ter uma queda na
pressão ou ter que fazer um novo “sprint” até o banheiro para vomitar.
E Treinos Tão Curtos Dão Mesmo Resultado?
O pesquisador Martin Gibala e
seus colegas, em 2006¹, compararam um treino de SIT (4-6 x 30s/4min) com um
treino contínuo de intensidade moderada (65% do VO2pico) de 90 a 120
minutos (é isso mesmo, 1 hora e meia a 2 horas pedalando). Ambos os grupos
treinaram na bicicleta ergométrica 3 vezes por semana ao longo de duas semanas
(6 sessões totais).
O que eles verificaram foi que,
apesar da grande diferença no volume do treino, ambos os grupos melhoraram o
tempo nos testes de 2km (SIT 4,1%; contínuo 3,5%) e 30km (SIT 10,1%;
contínuo 7,5%) de ciclismo contra-relógio, sem diferença entre os grupos. Além
disso, biópsias revelaram aumentos similares na capacidade oxidativa dos
músculos, capacidade de tamponamento e conteúdo de glicogênio muscular após o
treino.
Os cientistas concluíram que,
dada a grande diferença no volume de treino (2,5h vs. 10,5h em duas semanas), os dados demonstram que o SIT é uma
estratégia eficiente para induzir rápidas adaptações musculares e na
performance de homens jovens, comparáveis a um treino de endurance.
É Seguro Fazer SIT?
Desde que tomadas as devidas
precauções, o SIT pode ser considerado um método seguro.
Por causa da máxima intensidade
utilizada durante o SIT, ele é potencialmente mais lesivo do que outros métodos
submáximos de treinamento. Existe risco de ocorrência de lesões musculares,
tendíneas e até mesmo ósseas durante sprints de corrida ou outras modalidades
com impacto e mudança de direção, principalmente se sua técnica for inadequada.
Como regra geral, só use o SIT em
modalidades que você saiba fazer. Caso não tenha experiência em determinada
modalidade, uma preparação técnica é aconselhável. Procure um bom professor/técnico.
Em compensação, pesquisadores têm
utilizado com sucesso modelos de SIT em pessoas sedentárias, com sobrepeso ou
obesas.
Um estudo realizado por
pesquisadores do Reino Unido², em 2013, investigou os efeitos de uma
intervenção de SIT aplicada durante duas semanas, 3x por semana, em indivíduos
obesos (IMC médio de 31). Os treinos consistiam de 4 a 6 tiros de 30s em
bicicleta ergométrica, intercalado com intervalos de 4 minutos e meio de
descanso (4-6 x 30s/4,5min).
Ao fim de duas semanas houve
melhoras tanto no consumo máximo de oxigênio quanto na potência no teste de
Wingate (um tiro de 30s com uma carga pré-determinada no cicloergômetro). Além
disso, 24h após o treino os voluntários apresentavam maior sensibilidade à
insulina, maior utilização de gordura como energia, bem como uma menor
utilização de carboidratos e menor pressão arterial sistólica do que antes do
estudo. Depois de 72h essas mudanças já não eram mais significativas. Também
houve diminuição na circunferência da cintura e quadril dos participantes.
Segundo os autores, os dados encontrados
demonstram potencial para fornecer um modelo de exercício alternativo para a
melhora da saúde cardiovascular e metabólica dessa população (gordinhos).
E SIT Emagrece?
Um estudo³ muito interessante
nesse quesito foi realizado por pesquisadores brasileiros em 2018. Eles
compararam um protocolo de SIT vs. um
de HIIT Longo, aplicado em 49 mulheres jovens.
O protocolo de SIT utilizado foi
o de 4 x 30s/4min. Já o protocolo de HIIT longo foi o famoso 4x 4min/3min (4
tiros de 4min a 90-95% da FCmax/3min a 50-60% da FCmax). O treino foi repetido três
vezes por semana durante 8 semanas.
Ao fim do estudo o VO2pico
melhorou 16,9% para o grupo SIT vs.
14,5% para o grupo HIIT, sem diferença significativa entre os grupos.
Apenas o grupo SIT perdeu peso
(-1,2kg) e teve redução no Índice de Massa Corporal (IMC: -1,2 kg/m²).
Ambos os grupos diminuíram as
dobras cutâneas do tríceps, subescapular, suprailíaca e abdominal, sem diferença
significativa entre os grupos, já a dobra cutânea da coxa diminuiu mais no
grupo que fez SIT (-19,6 vs. – 13,6).
Na soma das 5 dobras cutâneas analisadas, houve uma maior redução para o grupo
que fez SIT (-22,2%) do que para o grupo que fez HIIT longo (-15,8%).
Segundo os autores:
“Ambos protocolos de SIT e HIIT aumentaram a aptidão cardiorrespiratória
e promoveram redução em indicadores de adiposidade em mulheres jovens e
saudáveis, mesmo na ausência de mudanças na dieta. Ademais, o protocolo de SIT
provocou melhores resultados em alguns marcadores de gordura corporal do que o
protocolo de HIIT”.
Os pesquisadores realçam a
importância das mudanças observadas na composição corporal das voluntárias
mesmo sem fazer dieta. Diversos estudos têm demonstrado que protocolos de
treino intervalado que causam depleção de glicogênio resultam num aumento da
utilização de gordura após o exercício. Parece que a reposição de glicogênio
tem uma prioridade metabólica durante a recuperação, levando a um aumento na
oxidação de gordura.
Como Usar Essa Informação
Baseado no que vimos até agora, as
recomendações básicas para o Treino Intervalado de Sprint (SIT), passo a passo,
seriam:
- Escolher uma modalidade de exercício que você saiba executar decentemente (com técnica apropriada e consistente);
- Iniciar com um bom aquecimento de cerca de 5 minutos (com intensidade moderada ou progressiva);
- Realizar tiros (entre 2 e 10, aproximadamente) de 15 a 45 segundos (30s costuma funcionar bem), procurando acumular um trabalho total de cerca de 2 minutos (ou 1 a 4 minutos) na maior intensidade possível (isto é, máxima);
- Intercalá-los com descanso passivo (preferencialmente mantendo-se em movimento) entre os tiros, com duração de 4 a 9 vezes o tempo do tiro (o ideal é em torno de 8);
Para algumas modalidades, tiros
mais longos funcionam melhor do que tiros mais curtos (e vice-versa). Se
perceber que os tiros foram muito fáceis, tente aumentar o tempo do
sprint.
Experimente as diferentes
durações de tiro/descanso possíveis. Comece de baixo e vá progredindo aos
poucos.
Em três semanas falaremos sobre o
treinamento de sprints repetidos, mas até lá você tem diversas possibilidades para
testar o SIT.
Fontes:
1. Gibala MJ, Little JP, van Essen M, Wilkin GP,
Burgomaster KA, Safdar A, Raha S, Tarnopolsky MA. “Short-term sprint interval
versus traditional endurance training: similar initial adaptations in human
skeletal muscle and exercise performance”. J Physiol. 2006 Sep 15;575(Pt
3):901-11.
2. Whyte LJ, Gill JM, Cathcart AJ. “Effect of 2
weeks of sprint interval training on health-related outcomes in sedentary
overweight/obese men”. Metabolism. 2010 Oct;59(10):1421-8.
3. Naves JPA, Viana RB, Rebelo ACS, de Lira CAB,
Pimentel GD, Lobo PCB, de Oliveira JC, Ramirez-Campillo R, Gentil P. “Effects
of High-Intensity Interval Training vs. Sprint Interval Training on
Anthropometric Measures and Cardiorespiratory Fitness in Healthy Young Women”.
Front Physiol. 2018 Dec 5;9:1738.
4. Buchheit M, Laursen PB. “High-intensity
interval training, solutions to theprogramming puzzle: Part I: cardiopulmonary
emphasis”. Sports Med. 2013May;43(5):313-38.
5. Buchheit M, Laursen PB. “High-intensity
interval training, solutions to theprogramming puzzle. Part II: anaerobic
energy, neuromuscular load and practical applications”. Sports Med. 2013
Oct;43(10):927-54.
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