Seu Percentual de Gordura Está Realmente Certo?

Descubra o quão errado podem estar os resultados de seu teste de gordura corporal.


No último artigo nós vimos que É Impossível Medir Seu Percentual de Gordura, a menos que você esteja morto.

Vimos que os educadores físicos, nutricionistas, médicos e afins não são capazes de “medir” sua gordura corporal. No máximo, eles podem lhe dar uma estimativa dela. E uma estimativa bem ruim.


Naquele artigo, nós também vimos os motivos pelos quais os testes mais comuns e válidos para estimar seu percentual de gordura podem dar errado, ou seja, suas fontes de erros.

Por fim, nós descobrimos que existe um modelo de quatro compartimentos, que é considerado o padrão ouro na ciência para estimativa da gordura corporal, uma combinação de três testes diferentes. Esse seria o modelo contra o qual todas as outras técnicas deveriam ser comparadas.

Nós vimos o “O quê”, o “Por quê” e o “Como”...

Mas nós não vimos “O Quanto” esses testes poderiam estar errados.

Hoje, nós vamos mergulhar mais fundo na toca do coelho e, finalmente, descobrir de quanto erro nós estamos falando em cada um dos métodos.

Este é um artigo longo, com quase 4500 palavras. Se você não liga para os dados (o quanto seu teste pode estar errado) e quer saber apenas o que fazer, você pode pular para as últimas seções deste texto.

Lembrando que esses artigos são baseados em uma série¹ escrita já há algum tempo pelo pesquisador James Krieger (@james.krieger). Você pode encontrar o conteúdo completo dela aqui (sendo necessário entender inglês).


Pequenos Grandes Erros

Nós precisamos começar este artigo diferenciando o quanto algo pode ser bom na média, e o quanto algo é bom ou não para indivíduos.

Por exemplo, imagine que nós estivéssemos criando um método para estimar gordura corporal usando um grupo de 4 pessoas e, dos resultados dessas 4 pessoas, quando comparadas ao padrão ouro, verificássemos que uma delas apresentou um erro de -10% em seu percentual de gordura, outra de -5%, a terceira +5% e a última +10%.

Nós poderíamos nos gabar de nosso método apresentar uma taxa de erro de 0% na média, com um erro padrão da estimativa próximo a ±4,5%. Baseado nisso, as pessoas que usassem nosso método esperariam, no máximo, um erro de 4,5% para cima ou para baixo em seus resultados. OK, isso já seria um erro grande, mas se você visse um teste com erros de “0% ±4,5" você provavelmente acharia que ele é bom.

No entanto, quando consideramos os indivíduos da nossa amostra, vemos que nosso método pode apresentar um erro real de até 10% para menos ou para mais em certas pessoas. Mais do que o dobro do erro que você esperaria.

Ou seja, quando você faz um teste e lhe dizem que a bioimpedância é precisa, apresentando um erro de até 3,5% em média, não é exatamente uma mentira; é apenas uma meia verdade.

Infelizmente, para observar essas diferenças individuais, nós temos que verificar estudos que apresentem esses dados individualizados e não apenas o erro médio do método.

Agora que entendemos isso, vamos comparar cada método verificado no último artigo com o modelo de 4 compartimentos.



Pesagem Hidrostática

Como no artigo anterior, vamos começar pela pesagem hidrostática e seguir aquela ordem, mas você pode pular diretamente para as seções que mais lhe interessam através do sumário deste artigo.

Então, como será que ela se sai quando comparado ao nosso padrão ouro?

As pesquisas demonstram que a pesagem hidrostática apresenta erros bem pequenos, na média, quando comparada ao modelo de 4 compartimentos. Ela tende a subestimar (ou seja, apresentar um valor menor) o percentual de gordura em 0,1 a 1,2%, embora um estudo tenha verificado uma superestimativa de 2,1% em mulheres jovens.

No geral, isso é muito bom. Desde que, claro, use-se a equação correta para sua população. A fórmula de Siri, mencionada no artigo anterior, aplica-se apenas a Caucasianos. Em um estudo feito em atletas negras, a média de erro aumentou para 2,6% quando uma equação desenvolvida para brancos foi utilizada, contra apenas 0,5% de erro quando uma equação desenvolvida para negros foi aplicada.

O problema é que os erros ficam significativamente maiores quando começamos a olhar para os indivíduos. A margem de erro individual pode chegar a 5 ou 6%. Ou seja, digamos que na pesagem hidrostática seu percentual de gordura estimado foi de 20%. Porém, na verdade, seu percentual de gordura real pode ser tão baixo quanto 15% ou tão alto quanto 26%, por exemplo. É uma grande diferença, e é impossível saber quão perto ou longe do resultado obtido seu percentual de gordura realmente está.

A pesagem hidrostática também vai apresentar problemas para verificar mudanças na gordura corporal ao longo do tempo. No artigo anterior, nós vimos que mudanças no peso corporal podem alterar a densidade da massa magra (principalmente em relação à água corporal), o que vai deixar ainda mais impreciso um método que já não é muito preciso individualmente.

Pesquisadores verificaram a precisão da pesagem hidrostática para determinar mudanças na gordura corporal em indivíduos e os resultados não são muito bons. Abaixo temos o gráfico de um desses estudos (feito em mulheres na pós-menopausa):

Gráfico 1: Pesagem Hidrostática x Modelo de 4 Compartimentos

A linha horizontal (eixo X) desse gráfico representa a variação no percentual de gordura (%G) segundo a pesagem hidrostática (2CHW), enquanto a linha vertical (eixo Y) representa o %G segundo o modelo de 4 compartimentos (4C). Cada círculo é um indivíduo (no caso, uma mulher).

Podemos ver que existe uma grande disparidade entre os métodos para alguns indivíduos. Por exemplo, a pessoa que eu pintei de vermelho ganhou quase 10% de gordura corporal segundo o modelo de 4C; foi ruim sim, mas segundo a pesagem hidrostática ela teria ganho 18% de gordura, muito pior. Já a pessoa pintada de azul perdeu 10% de gordura corporal segundo o modelo de 4C, mas de acordo com a pesagem hidrostática ela perdeu apenas cerca de 1%. Imagina o psicológico dessa senhora depois de 9 semanas em uma dieta hipocalórica. Em ambos os casos, os erros chegaram a 8-10 pontos percentuais (ao que vou simplificar como %, ao invés de p.p. durante todo este artigo, já que não vamos falar de porcentagens relativas em nenhum momento).

Isso significa que a pesagem hidrostática pode estimar que você teve uma perda muito pequena de gordura corporal, quando na verdade você teve uma perda bem grande. Ou ainda pode estimar que você teve um ganho enorme de gordura, quando de fato você não ganhou tanto assim.

Embora exista uma relação razoável com o modelo de 4 compartimentos para a maioria das pessoas, a pesagem hidrostática ainda apresenta erros suficientes em algumas delas para que se recomende cautela no uso desse método para avaliar mudanças na gordura corporal ao longo do tempo em uma determinada pessoa.

Existe um método de pesagem hidrostática associada à determinação da água corporal total (usando a diluição de óxido de deutério) - ou seja, um modelo de 3 compartimentos (água, massa gorda e massa magra) - que apresenta margens de erro significativamente menores (“3Cw” do Gráfico 4, encontrado na seção de bioimpedância, mais abaixo) que a pesagem hidrostática sozinha (± 1 a 1,5%), desde que, claro, use-se uma equação apropriada ao indivíduo. E isso também envolve o uso de dois métodos diferentes, sendo que um deles não é muito comum clinicamente.

Veredito:

O lado bom é que a pesagem hidrostática pode apresentar bons resultados ao avaliar a média de um grupo, mas seus resultados não são tão bons individualmente.

O lado ruim é que a pesagem hidrostática ainda é o melhor método existente entre os modelos de 2 compartimentos. Outros métodos como o Bod Pod, bioimpedância e dobras cutâneas são significativamente piores.

Então, vamos ao próximo.



Bod Pod - Pletismografia por Deslocamento de Ar

Como citamos no artigo anterior, os princípios do Bod Pod são similares aos da pesagem hidrostática, apenas mudando a matéria deslocada (ar vs. água); então deveríamos esperar margens de erro semelhantes, correto?

Em alguns casos, pode até ser que sim. Um estudo encontrou erros de até 2% na média, mas margens de erro de até 6% em indivíduos. Porém, outras pesquisas feitas com o Bod Pod apresentaram erros maiores do que a pesagem hidrostática; uma delas encontrou uma diferença média de 5,3% entre o Bod Pod e o modelo de 4 compartimentos, além de erros de até 15% em indivíduos.

E, assim como na pesagem hidrostática, o Bod Pod pode apresentar erros ao avaliar mudanças no %G ao longo do tempo. Aquele mesmo estudo do gráfico da pesagem hidrostática demonstrou que o Bod Pod parece ser bem ruim para detectar mudanças na gordura corporal. Veja no gráfico:

Gráfico 2: Bod Pod x Modelo de 4 Compartimentos

No eixo X temos a variação do %G segundo o Bod Pod (2CADP), enquanto no eixo Y temos, novamente, o modelo de 4C. Esse gráfico é cheio de bons exemplos (ruins). A pessoinha pintada de vermelho, por exemplo, segundo o Bod Pod perdeu quase 2% de gordura, mas na verdade ela ganhou 10% conforme o modelo de 4C. A pessoa em azul perdeu 5% de gordura (pelo modelo de 4C), mas segundo o Bod Pod ela perdeu incríveis ~11%. Já a pessoa em laranja perdeu uns quase 6% de gordura pelo modelo 4C, mas de acordo com o Bod Pod ela não perdeu nada (ou até ganhou um pouquinho). Por último, aquele pontinho roxo no alto, ganhou uns 5% de gordura corporal (4C), mas segundo o Bod Pod ela perdeu uns 7% de gordura - sortuda.

Os resultados do Bod Pod foram tão ruins nesse estudo que eles não apresentaram nenhuma relação com os resultados do modelo de 4 compartimentos. Isso é o que significa aquele “R² = 0.00” no meio do gráfico. Isso quer dizer que o Bod Pod é horrível para avaliar mudanças em indivíduos ao longo do tempo.

Veredito:

O Bod Pod é razoável para avaliar a média de um grupo, com alguns estudos apresentando médias de erro entre 2 e 5%. Porém, as margens de erro individuais do Bod Pod podem ser inaceitavelmente altas em alguns indivíduos e ele é muito ruim para avaliar mudanças ao longo do tempo. Por conta disso, o Bod Pod não parece ser um método fidedigno para avaliar a evolução da composição corporal de um cliente. A pesagem hidrostática, apesar de seus problemas, é muito mais confiável.

Embora disponíveis em certos locais, essas duas técnicas não são as mais comuns para avaliação da população em geral.

Então, vamos ver as mais populares agora.



Bioimpedância

Indiscutivelmente o método mais rápido e fácil para estimar a gordura corporal, a bioimpedância apresenta um grande problema, que é o fato de tentar estimar quanto seria seu resultado caso você fizesse um outro teste estimativo (como a pesagem hidrostática, por exemplo). Claro que isso depende da equação utilizada pelo aparelho.

Como o método inicial já possui um erro associado, os erros derivados do teste de bioimpedância irão somar-se aos daquele método (nesse exemplo, a pesagem hidrostática). Então, nós estamos multiplicando os erros, fazendo uma estimativa da estimativa. Isso foi o que chamei de “erros compostos” no artigo anterior.

E de quanto erro nós estamos falando exatamente?

Muito! Abaixo segue o gráfico de um estudo de 2007 que comparou a diferença entre a gordura corporal avaliada via bioimpedância contra o modelo de 4 compartimentos:

Gráfico 3: Bioimpedância x Modelo de 4 Compartimentos 

O eixo X mostra a diferença (em kg) entre o resultado da bioimpedância e do modelo de 4C. O eixo Y mostra a quantidade de pessoas que apresentou essa diferença (o estudo envolveu 50 pessoas obesas e 88 testes completos no total).

Em primeiro lugar, perceba que as barras do gráfico estão deslocadas para a direita do zero. Isso significa que a bioimpedância teve uma tendência de subestimar o percentual de gordura para a maioria das pessoas quando comparada ao padrão ouro (4C). Depois, podemos ver que algumas pessoas apresentaram diferenças bem grandes nos resultados. 11 testes apresentaram diferenças de -5kg a -7,5kg de gordura corporal comparado ao que elas realmente tinham (segundo o modelo 4C). Se considerarmos diferenças maiores que 3kg de gordura temos 23 testes (3 para mais e 20 para menos).

Um outro estudo realizado em fisiculturistas encontrou uma diferença de 8% para mais ou para menos (com um erro médio de -1%) através dos testes de bioimpedância. Veja no gráfico abaixo:


Gráfico 4: Bioimpedância (em vermelho) e outros métodos comparados ao Modelo de 4C

Como você pode ver, a bioimpedância (BIA) teve a maior variação entre todas as técnicas, perdendo com pouca diferença até mesmo para as dobras cutâneas (SF). Então, parece que ela não é um método muito bom para avaliar fisiculturistas.

E Para Avaliar Mudanças ao Longo do Tempo?

Os profissionais que usam a bioimpedância para avaliar seus clientes podem contra-argumentar que o número resultante do teste não é tão importante, mas que seu resultado pode ser usado para verificar a evolução de seus clientes ao longo do tempo. A teoria para esse argumento seria a de que o erro da bioimpedância deveria ser o mesmo toda vez que você a usasse.

O problema é que isso, provavelmente, não é verdade. Como visto no artigo anterior, vimos que a densidade e hidratação da massa magra podem variar com a perda de peso e outros fatores (como dieta e exercícios físicos). E se isso poderia afetar o percentual de gordura estimado pela pesagem hidrostática, certamente os efeitos nos resultados da bioimpedância seriam, provavelmente, ainda piores.

Muitas pesquisas já se debruçaram sobre a precisão da bioimpedância para avaliar mudanças na gordura corporal ao longo do tempo. Em um estudo de 1999, feito em mulheres antes da menopausa, a diferença entre a bioimpedância e o modelo de 4 compartimentos ficou entre -3,6% e +4,8% ao analisar tais alterações. Ou seja, você poderia ter perdido 3,6% de gordura, mas o resultado da bioimpedância poderia dizer que você não teve nenhuma alteração. Ou a bioimpedância poderia dizer que você perdeu 8,8% de gordura, quando na verdade você perdeu apenas 4%. Nesse estudo, os autores concluíram, inclusive, que “o IMC estimou as mudanças no %G tão bem quanto ou melhor do que o DEXA, a bioimpedância e as dobras cutâneas”, apesar de ele ser o teste que pior determinou o percentual de gordura inicialmente.

Aquele estudo com fisiculturistas que vimos anteriormente também verificou a precisão do método para avaliar as mudanças na gordura corporal. E os erros foram tão ruins quanto antes:


Gráfico 5: Variação da Bioimpedância e outros métodos na avaliação de mudanças no %G contra o modelo de 4C

Comparado aos outros métodos avaliados, a bioimpedância (BIA) apresentou a maior variação nos resultados; maior até que o IMC (índice de massa corporal - BMI). As margens de erro chegaram a quase 6,5% para cima ou para baixo (ficando entre, aproximadamente, +8% e -5%, com um viés de ~+1,5%). Ou seja, você poderia perder uns 2% de gordura corporal, mas a bioimpedância poderia mostrar que você ganhou 5%. Bastante impreciso.

Da época desses estudos para cá, parece que a técnica não evoluiu muito em sua precisão.

Em um estudo mais atual, de 2016, a bioimpedância apresentou um erro médio de -0,1 a +3,7%, indicando uma precisão razoável para a média da população. As 4 equações analisadas tenderam a superestimar (mostrar um resultado maior) a gordura corporal comparado ao modelo de 4 compartimentos (exceto que, nesse caso, foi utilizada a bioimpedância multifrequência de espectroscopia para avaliar a água corporal total, ao invés do método de referência – diluição do óxido de deutério). Segundo esse estudo, a massa magra foi subestimada em -0,1 a -2,9kg.

Porém, a níveis individuais, as margens de erro no percentual de gordura obtido pela bioimpedância ficaram entre +11,1% e -6,5% em 95% dos indivíduos, indicando erros significativos. Os erros na avaliação da massa magra também foram bem ruins, ficando entre -9,1kg e +4,3kg. Nesse estudo não foram avaliadas mudanças ao longo do tempo.

Veredito:

A bioimpedância pode ser problemática para estimar seu percentual de gordura, com algumas pesquisas mostrando erros de até 8-9%. Para estimar mudanças ao longo do tempo, a bioimpedância também pode apresentar erros de até 6,5%.

Assim, se você, por extrema necessidade, tiver que utilizar a bioimpedância para avaliar sua composição corporal ao longo do tempo, seria prudente que você fizesse isso usando intervalos bem longos (no mínimo 3 meses, mas provavelmente 6 seria melhor), já que as margens de erro desse método tendem a ser bem altas; mais altas do que as mudanças em sua composição corporal devem ocorrer no curto prazo.

Mesmo assim, qualquer que seja o resultado obtido na bioimpedância, lembre-se que esse número representa uma estimativa bem grosseira de sua gordura/composição corporal. Com ênfase no BEM GROSSEIRA.



Dobras Cutâneas

Esse teste apresenta o mesmo problema da bioimpedância, que é tentar estimar uma estimativa. E normalmente as equações utilizadas não são baseadas no modelo de 4 compartimentos (existem algumas que são, mas as mais populares são baseadas na pesagem hidrostática). Então, o teste de dobras cutâneas também vai apresentar erros “dobrados” (pegou o trocadilho?). Ele pode apresentar erros significativos tanto na média de uma amostra quanto em indivíduos.

Em um estudo de 2016, o teste de dobras cutâneas apresentou um erro médio de -4,8% (em 130 adultos, homens e mulheres jovens), indicando que esse teste subestimou o percentual de gordura quando comparado ao modelo de 4 compartimentos. Individualmente, as margens de erro do teste de dobras cutâneas foram ainda maiores, ficando entre +2,5% e -12%, considerando 95% dos indivíduos.

Em outro estudo, o teste de dobras cutâneas subestimou o percentual de gordura em 6,6% em mulheres brancas (usando a fórmula de Jackson e Pollock), isso considerando a média de todo o grupo. Em compensação, quando usada a fórmula de Durnin e Womersley (de 1974), o percentual de gordura médio da amostra foi subestimado em apenas 2,4%.

As margens de erro individuais (em ambas as equações citadas) foram enormes, desde uma superestimativa de 8-10% até uma subestimativa de 16,5%. E isso não ocorreu só com as mulheres. Nos homens, as margens de erro não foram melhores. Utilizando a equação de Durnin e Womersley, as margens de erro individuais dos homens também chegaram a 10-15% tanto para baixo quanto para cima (enquanto o erro médio do grupo ficou em -3,1% - até que razoável). Outros estudos chegaram a resultados muito semelhantes.

E quanto à avaliação das mudanças ao longo do tempo?

Em um estudo com mulheres obesas que perderam peso, o teste de dobras cutâneas se saiu razoavelmente bem na avaliação da média do grupo, subestimando o %G em cerca de 1%. Agora, as margens de erro individuais foram maiores, entre -3,6% e +4,2%. Ou seja, você poderia perder 4% de gordura, mas seu teste de dobras cutâneas poderia dizer que você não perdeu nada; ou seu teste de dobras cutâneas poderia dizer que você perdeu 6% de gordura, quando na verdade você perdeu somente 3%. Um estudo com fisiculturistas (vide "SF" nos gráficos 4 e 5, acima) apresentou margens de erro similares (-3% a +3,5%), tanto individuais quanto na média do grupo (cerca de 0,1%).

Veredito:

Assim como a bioimpedância, as dobras cutâneas podem ser bem imprecisas para determinar o percentual de gordura de indivíduos. No entanto, quando se trata de avaliar mudanças na gordura corporal ao longo do tempo, o teste de dobras cutâneas até que vai bem. Ainda assim, as margens de erro individuais podem chegar a 3-5%. Assim, se você for usar esse teste para avaliar as mudanças na composição corporal, seria prudente utilizar intervalos longos entre os testes (algo como 3 a 6 meses); do contrário esbarramos no mesmo problema da bioimpedância - o erro é maior do que as mudanças que podem ocorrer no curto prazo.

Na verdade, se você usar o teste de dobras cutâneas, o resultado seria muito mais preciso se você não calculasse seu percentual de gordura. Se as dobras cutâneas (individualmente ou a soma delas) estiverem diminuindo, então você provavelmente está perdendo gordura.



DEXA - Absorciometria por Emissão de Raios-X de Dupla Energia

Finalmente saindo do modelo de 2 compartimentos, entramos no modelo de 3 compartimentos com o DEXA.

Sendo um dos métodos mais utilizados para avaliar composição corporal nas pesquisas científicas, a tecnologia do DEXA evoluiu bastante nos últimos anos (há alguns anos atrás um exame levava 20-25 minutos; atualmente o mesmo é feito em 5-10 minutos). Trata-se de um método conveniente e não invasivo, porém seu preço é um pouco salgado para ser considerado um exame a ser aplicado na população em geral.

E será que vale a pena pagar esse preço?

Avaliando a média de uma amostra, o DEXA se sai muito bem, com erros na casa de 1-2%. Contudo, da mesma forma que nos outros testes, as margens de erro individuais podem ser bem maiores.

Essas margens de erro variam conforme os estudos analisados e os equipamentos utilizados; há margens de erro na casa dos 4,5 a 5,5% em um estudo (com variações de -2,6 a 7,3%), enquanto outro estudo apresenta erros de até 10-11%. A precisão do DEXA também pode ser afetada pelo sexo, tamanho do indivíduo, quantidade de gordura corporal e certas doenças.

O DEXA também apresenta problemas para avaliar mudanças ao longo do tempo.

Em um estudo os pesquisadores amarraram gordura em volta das pernas dos sujeitos para simular ganho de peso. Porém, isso apresentou alterações no conteúdo mineral ósseo e na densidade mineral, pondo em dúvida a capacidade do DEXA de avaliar com precisão mudanças na composição corporal.

Em um estudo com fisiculturistas, o DEXA teve uma precisão razoável ao avaliar as alterações no percentual de gordura médio do grupo/amostra, mas as margens de erro individuais chegaram à quase 4% (veja “DXA” do gráfico 5). Ou seja, você poderia perder 4% de gordura e o DEXA mostrar que você não perdeu nada, ou o DEXA poderia mostrar uma alteração de 4% quando, na verdade, sua gordura corporal não se alterou.

Outro estudo demonstrou que o DEXA tende a superestimar reduções no percentual de gordura e subestimar os aumentos na gordura corporal. As discrepâncias ficaram entre -4,0 e +4,6%. Um estudo comparou as mudanças na composição corporal avaliadas pelo DEXA contra o modelo de 4 compartimentos; aqui está o gráfico dele:

Gráfico 6: DEXA x Modelo de 4 Compartimentos

No eixo X temos a variação no %G obtido pelo DEXA (4CDXA), enquanto o eixo Y apresenta a variação conforme o modelo de 4 compartimentos. Nota-se que a discordância entre os métodos foi grande. Por exemplo, o pontinho vermelho engordou uns 10% conforme o modelo de 4C, porém, segundo o DEXA, perdeu 1% de gordura corporal. A pessoa pintada de azul perdeu uns 3% de gordura, mas de acordo com o DEXA teria perdido 6%. Já a pessoa em laranja perdeu cerca de 10% pelo modelo de 4C, mas o DEXA disse que ela perdeu por volta de 4,5%. Por fim, o pontinho roxo perdeu uns 6% de gordura corporal, mas segundo o DEXA essa perda não chegou a 1%.

Esses resultados colocam em cheque a capacidade do DEXA em avaliar mudanças no percentual de gordura corporal ao longo do tempo em indivíduos.

Veredito:

Apesar do DEXA representar um modelo de 3 compartimentos, seus resultados não são mais precisos do que a pesagem hidrostática, e em alguns casos são até piores. Assim como as outras técnicas, o DEXA pode avaliar bem a média de um grupo, mas quando se trata de avaliações individuais, ele pode apresentar erros por volta de 5%, podendo chegar a até 11% segundo alguns estudos.

Seus resultados também não são muito precisos para avaliar mudanças na composição corporal ao longo do tempo. Com erros na casa dos 5% em alguns estudos e outros apresentando resultados ainda piores, seria prudente utilizar intervalos bem longos (entre 3 e 6 meses, no mínimo) caso você decida fazer avaliações de sua evolução através desse exame, já que uma mudança menor que 5% no percentual de gordura pode não ser detectada com confiança na maioria das pessoas.


Com isso nós finalizamos a análise dos métodos mais comuns para estimar sua gordura corporal.



O Que Isso Tudo Significa para Você

Depois de verificarmos que todas as técnicas aqui mostradas possuem margens de erro bem grandes, maiores do que a maioria das pessoas imagina, ficam algumas dúvidas:

Uma delas seria - Qual teste escolher, afinal?

E isso é uma decisão pessoal, dependendo de sua disponibilidade de tempo, dinheiro e levando em conta outros aspectos de cada teste (como ter que mergulhar num tanque/piscina na pesagem hidrostática, por exemplo).


E a outra - Então, fazer um teste de gordura corporal é inútil para nós, indivíduos?

E não é bem isso. Os testes podem ser úteis, mas você deveria interpretar os resultados com cautela, independente da técnica utilizada, sabendo que eles possuem uma grande margem de erro.



O Que Fazer Com Essa Informação

Seguem alguns pontos importantes:

  • Sempre tenha em mente que, qualquer que seja o número que seu teste cuspir, trata-se de uma estimativa grosseira de seu percentual de gordura, e ela pode estar bem errada, independente do teste utilizado.

  • A mesma coisa ocorre quando você tenta avaliar sua evolução ao longo do tempo. Você nunca vai ter uma precisão suficiente para sair espalhando por aí que você “perdeu 2kg de gordura e ganhou 1kg de músculos”. Os testes não são tão precisos e há uma boa chance que seu resultado real não seja esse.

  • Mesmo os melhores métodos apresentam uma margem de erro individual na casa dos 4-5% na avaliação da evolução de sua composição corporal. Levando isso em conta, para detectar uma redução na gordura corporal, seu percentual de gordura teria que diminuir no mínimo uns 4 ou 5%. Isso significa que você não precisa fazer testes toda semana ou todo mês; um intervalo de 3 meses deveria ser o mínimo a ser cogitado, mas uns 6 meses seria provavelmente melhor.

  • Lembre-se que massa magra e músculos não são a mesma coisa. Então, um ganho de massa magra pode não significar ganho de músculos; assim como sua perda. A água corporal influencia bastante na massa magra na maioria dos testes, principalmente em certas populações (atletas, pessoas em dieta com restrição de carboidratos, etc).

  • Você não precisa fazer um teste de percentual de gordura. Simplesmente monitorar seu peso corporal, algumas medidas (como circunferência de cintura) e se olhar no espelho “com sinceridade”, vão lhe dar uma boa ideia se você está ou não perdendo gordura corporal.

  • Se você realmente necessitar de um número (tem gente que só funciona com números) para avaliar as mudanças na sua gordura corporal ao longo do tempo, os dois testes mais recomendados seriam a pesagem hidrostática (se você tiver tempo e condições de pagar pelo exame) ou o teste de dobras cutâneas. Contudo, essas técnicas podem ser impróprias para indivíduos muito obesos, nesse caso, o peso corporal junto com algumas circunferências seriam mais indicados.

  • Se você escolher o teste de dobras cutâneas para avaliar sua evolução ao longo do tempo, você nem mesmo precisa calcular seu percentual de gordura. Se a soma das suas dobras cutâneas estiver diminuindo, então você está perdendo gordura.

  • Seja qual for o método que você escolher, mantenha as condições dos testes e retestes as mais idênticas que puder. Isso significa fazer o exame com o mesmo profissional, usando o mesmo equipamento, na mesma hora do dia e com as mesmas condições prévias (na medida do possível).




Fontes:
1. Krieger J. “The Pitfalls of Body Fat “Measurement””. Weightology - Body Fat Testing, Part 1 to 6.  https://weightology.net/the-pitfalls-of-body-fat-measurement-part-1/
2. Krieger J. “The Pitfalls of Body Fat “Measurement”, The Final Chapter”. Weightology - Body Fat Testing. https://weightology.net/the-pitfalls-of-body-fat-measurement-the-final-chapter/
3. Krieger J. “The Pitfalls of Body Fat “Measurement”: BIA & Skinfolds Strike Again”. Weightology - Body Fat Testing. https://weightology.net/the-pitfalls-of-bodyfat-measurement-bia-skinfolds-strike-again-free/

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